No nos apresuremos a sacar de estos hechos conclusiones aplicables ao hombre. El hombre tiene la
facultad de no someterse a las leyes de la Naturaleza; saber si hace mal o bien en usar de esa
facultad, es el punto más grave y menos aclarado de la moral. Pero no por eso es menos interesantes
sorprender la voluntad de la Naturaleza, en un mundo distinto. Pues, en la evolución, que,
inmediatamente después del hombre, son los habitantes del globo más favorecidos desde el punto de
vista de la inteligencia, dicha voluntad parece muy clara. Tiende visiblemente a la mejora de la
especie, pero demuestra al propio tiempo visiblemente a la mejora de la especie, pero demuestra al
propio tiempo que no desea o no puede obtenerla sino con detrimento de la libertad, de los derechos y
de la felicidad propias del individuo.
A medida que la sociedad se organiza y se eleva, la vida particular de cada uno de sus miembros
ve decrecer su círculo. En cuando hay progreso en alguna parte, éste sólo resulta del sacrificio casa
vez más completo del interés personal al general. En primer término es menester que cada, cual
renuncie a vicios que son actos de independencia.
“E nós, - pergunta um poeta assim próprio, - deveremos sempre comprazer-nos, acima da verdade?”
Sim, a qualquer propósito, a todo o momento, em todas as coisas não acima da verdade, o que é
impossível, pois que, não sabemos onde ela reside, mas acima das pequeninas verdades que nós
entrevemos. Se algum acaso, uma recordação, uma ilusão, uma paixão, um motivo qualquer, faz que um
objeto se nos afigure mais belo do que se afigura aos outros, devemos querer bem a esse motivo. Tal
vez ele seja errado; mas o erro não impede que o momento, em que o objeto nos parece mais admirável,
seja aquele em que mais provavelmente lhe descortinaremos a verdade. A beleza que lhe atribuímos
dirige a nossa atenção para as suas verdadeiras belezas e grandezas, que não são fáceis de descobrir
e que se encontram nas relações, que qualquer objeto necessariamente tem com leis, com forças gerais
o eternas. A faculdade de admitir que nós fizemos nascer a propósito de uma ilusão não estará perdida
para a verdade, que há de chegar, cedo ou tarde.
É com palavras, com sentimentos, é com o entusiasmo desenvolvido por antigas belezas
imaginárias, que a humanidade colhe hoje verdades, que talvez não tivessem nascido nem encontrado
ambiente favorável se essas sacrificadas ilusões não tivessem primeiro habitado e aquecido o coração
e a razão, onde as verdades vão descer. Felizes os olhos que não precisam de ilusão para ver a
grandeza do espetáculo! Para os outros, é ilusão que os ensina a ver, a admirar e a comprazer-se. E
por mais alto que olhem, nunca poderão ver muito alto. Desde que se aproximam, a verdade eleva-se;
desde que admiram, aproxima-se. E por mais alto que suba o seu comprazimento, nunca se comprazerão no
vácuo, nem acima da verdade desconhecida a eterna, que é, sobre todas as coisas, como beleza em
suspensão.
A onde vão eles? - perguntaria a si próprio, depois de nos ter observado durante anos ou
séculos; - que fazem? Qual é o centro e o alvo da sua vida? Obedecer a algum Deus? Não vejo nada que
lhes guie os passos. Um dia, parecem edificar e amontoar pequenas coisas, e, no dia seguinte,
destroem-nas. Vão e voltam, juntam-se e dispersam-se, mas não se sabe o que desejam. Oferecem uma
infinidade de espectáculos inexplicáveis. Vê-se, por exemplo, que não fazem, por assim dizer, nenhum
movimento. Muitas vezes, uns são mais volumosos que outros. Ocupam habitações, dez ou vinte vezes
mais vastas, mais engenhosamente edificadas e mais ricas, que as habitações usuais.
Nós também obedecemos simplesmente às necessidades, à atração do prazer ou ao horror do
sofrimento; e o que chamamos a nossa inteligência tem a mesma origem e a mesma missão do que chamamos
instinto nos animais. Realizamos certos atos, cujos efeitos julgamos conhecer, e os sentimos,
gadanho-nos de penetrar as causas , melhor que os animais; mas além de que essa suposição não tem
base inabalável, aqueles atos são mínimos e raros, comparados com a quantidade enorme dos outros; e
todos eles, os mais conhecidos e os mais ignorados, os menores e os mais grandiosos, os mais próximos
e os mais afastados, realizam-se numa noite profunda, onde é provável que nos víssemos quase cegos
como supomos que são elas.
Se bem o consideramos, procede daquele simples bom senso, que frequentemente faz muito mal e que
respondia a Galileu: - “Não é a Terra que gira, porque vejo o Sol mover-se nos céus, subir de manhã e
descer à tarde, e porque nada pode prevalecer ao testemunho dos meus olhos.” - O bom senso é
excelente e necessário ao nosso espíritu, mas com a condição de que lhe assista uma desconfiança
elevada, e lhe lembre, em caso de necessidade, a sua infinita ignorância: aliás, não é senão a rotina
das partes inferiores da nossa inteligência. Não é espantoso que a nossa ciência seja tão curta como
a nossa experiência? Não sabemos nós que, na evolução de uma espécie, um século passa despercebido,
como uma gota de chuva no seio de um rio, e que, na vida da matéria universal, os milenários passam
tão depressa como os anos na história de um povo?.
Mas se aceitamos, por um instante, a hipótese do transformismo, o espectáculo dilata-se e o seu
clarão grandioso atinge logo os nossos próprios destinos. Não é evidente, mas o observador atento
facilmente reconhecerá que existe na natureza uma vontade que tende a elevar uma porção da matéria a
um estado mais sutil e talvez melhor, a penetrar-lhe pouco a pouco a superfície com um fluido cheio
de mistério, que primeiro chamamos visa, depois instinto, e logo em seguida inteligência; a
assegurar, a organizar, a facilitar a existência de tudo que se anima para um fim desconhecido. Não é
certo, mas os exemplos que vemos em volta de nós convidam-nos a supor que, se pudéssemos avaliar a
quantidade de matéria que desde a origem se criou assim, verificar-se-ia que ela não deixou de
aumentar. Repito que a observação não é de grande monta, mas é a única que ainda se pode fazer à
cerca da força oculta que nos conduz; e já é muito, enquanto não houver certeza contrária, neste
mundo, em que o nosso primeiro dever é a confiança na vida, ainda que no mundo se não descobrisse
nenhuma luz animadora.
Não é preciso aceitar cegamente as verdades proclamadas na época em que se vive. Mas quando se
não pode saber a verdade de uma coisa, bom é que se aceite a hipótese de que, no momento em que o
acaso nos faz nascer, se impõe mais imperiosamente a razão. Poderá ser falsa; mas, enquanto se julga
verdadeira, pe útil, reanima encoraja e impulsiona a investigação numa nova direção. a primeira
vista, para substituir suposições engenhosas, pareceria mais discreto dizer simplesmente a verdade
profunda, que é a ignorância. esta verdade, porém seria salutar, como se se provasse que sempre se
ignorará; e manter-nos-ia, entretanto numa imobilidade mais funesta que as irritantes ilusões.
Nós somos assim, nada nos leva mais longe nem mais alto, do que o impulso de nossos erros. Na
essência, o pouco que temos aprendido devemo-lo a hipótese, sempre arriscadas, muitas vezes absurdas,
e, pela maior parte, menos circunspectas que as de hoje. Transmitimos aquele ardor, não intacto, mas
aumentado, e nada pode aumentá-lo mais que a hipótese do transformismo, que nos força a interrogar,
com método severo a paixão constante, tudo que existe sobre a terra, nas suas entranhas, nas
profundidades do mar e na vastidão dos céus. Que é o que se lhe opõe, e que temos nós para pôr no seu
lugar, se a rejeitamos? Temos a grande confissão da ignorância sábia que se conhece, mas que, de
ordinário, é inativa e desanima a curiosidade, mais necessária ao homem que a própria sabedoria; ou
temos a hipótese da fixidez das espécies e da criação divina, que afasta para sempre as partes vivas
do problema e se desembaraça do inexplicável, prohibido interrogá-lo.
Bom pode ser que tudo isto seja fantasia e que nossa espiral de clarões, não se ilumine senão
para diversão das trevas. Pode ser também que um enorme incidente, vindo de fora, de outro mundo ou
de um fenômeno, dê repentinamente sentido definitivo aquele esforço ou definitivamente o destrua.
Sigamos, entretanto, o nosso caminho, como se nada de anormal devesse sobreviver. Suponhamos que
amanhã uma revelação, por exemplo, uma comunicação com um planeta mais antigo e mais luminoso devesse
transformar a nossa natureza, suprimir as paixões, as leis às verdades radicais do nosso ser, - mais
prudente seria consagrar todo o dia de hoje a tomar interesse por essas paixões, por essas leis e por
essas verdades, a harmonizá-las em nosso espírito, a mantermo-nos fiéis ao nosso destino, que se
cifra em dominar e elevar, alguns graus ao menos, as forças obscuras da vida, em nós próprios e em
volta de nós.
É possível que nada subsista naquela revelação, mas é impossível que aqueles que tenham cumprido
até o final a missão que prega por excelência missão humana, se não encontrem na primeira fila para
acolher aquela mesma revelação e dado até que ela lhes ensinasse que o verdadeiro e único dever seria
a descuriosidade e a resignação com o incognoscível , eles saberiam melhor que os outros, compreender
essa descuriosidade e resignação definitivas, e delas tirar proveito. Como todos procedem com forças
iguais, ainda que tivessem começado por perjudicar-se o menos possível, isto é, a ajudar-se; terão
pois a aparência de se entenderem, e de concorrerem para o mesmo alvo; e o observador certificar-se-á
de que cada movimento terá o seu motivo; e daí surgirão maravilhas ou monstros de raciocínios sem
número; pois aqueles dez mil indivíduos, que foram todos produzidos ao mesmo tempo, não podem deixar
de fazer todos a mesma coisa, e, por pouco sentimento que tenham, de tomar os hábitos comuns, de se
combinar, de se encontrar, de se ocupar da sua habitação, de lá voltar depois de se terem afastados,
etc.; e daqui a arquitectura, a geometria, a ordem, a previdência, o amor pátrio, a república, numa
palavra, tudo baseado, como se vê, na admiração do observador.
Eis uma forma, realmente avessa de explicar. Pode parecer mais natural à primeira vista; mas não
o será de fato, pela razão muito simples de que não explica quase nada? Perjudicando-se o menos
possível, de acordo com as necessidades da vida comum, não pressupõe acaso certa inteligência, que
parecera tanto mais notável, quanto se examinar de mais perto a maneira com que aqueles “dez mil
indivíduos” evitam prejudicar-se e chegam a ajudar-se? Portanto, não é falar verdade; e que diz o
velho naturalista mal-humorado, que se não aplique exatamente a todas as nossas sociedades humanas? A
nossa discrição, as nossas virtudes, a nossa política, ruins frutos da necessidade que a nossa
imaginação dourou, não têm outro alvo senão servir ao nosso egoísmo e converter em bem comum a
atividade, naturalmente prejudicial, de cada indivíduo. Além disso, não temos predicados para julgar,
em nome da nossa inteligência, as deficiências e os erros. Pois não temos nós visto que a nossa
consciência e a nossa inteligência vivem muito tempo em meio de erros, sem os perceber, e sem lhes
dar remédio?
No nos apresuremos a sacar de estos hechos conclusiones aplicables ao hombre. El hombre tiene la facultad de no someterse a las leyes de la Naturaleza; saber si hace mal o bien en usar de esa facultad, es el punto más grave y menos aclarado de la moral. Pero no por eso es menos interesantes sorprender la voluntad de la Naturaleza, en un mundo distinto. Pues, en la evolución, que, inmediatamente después del hombre, son los habitantes del globo más favorecidos desde el punto de vista de la inteligencia, dicha voluntad parece muy clara. Tiende visiblemente a la mejora de la especie, pero demuestra al propio tiempo visiblemente a la mejora de la especie, pero demuestra al propio tiempo que no desea o no puede obtenerla sino con detrimento de la libertad, de los derechos y de la felicidad propias del individuo.
A medida que la sociedad se organiza y se eleva, la vida particular de cada uno de sus miembros ve decrecer su círculo. En cuando hay progreso en alguna parte, éste sólo resulta del sacrificio casa vez más completo del interés personal al general. En primer término es menester que cada, cual renuncie a vicios que son actos de independencia.
“E nós, - pergunta um poeta assim próprio, - deveremos sempre comprazer-nos, acima da verdade?” Sim, a qualquer propósito, a todo o momento, em todas as coisas não acima da verdade, o que é impossível, pois que, não sabemos onde ela reside, mas acima das pequeninas verdades que nós entrevemos. Se algum acaso, uma recordação, uma ilusão, uma paixão, um motivo qualquer, faz que um objeto se nos afigure mais belo do que se afigura aos outros, devemos querer bem a esse motivo. Tal vez ele seja errado; mas o erro não impede que o momento, em que o objeto nos parece mais admirável, seja aquele em que mais provavelmente lhe descortinaremos a verdade. A beleza que lhe atribuímos dirige a nossa atenção para as suas verdadeiras belezas e grandezas, que não são fáceis de descobrir e que se encontram nas relações, que qualquer objeto necessariamente tem com leis, com forças gerais o eternas. A faculdade de admitir que nós fizemos nascer a propósito de uma ilusão não estará perdida para a verdade, que há de chegar, cedo ou tarde.
É com palavras, com sentimentos, é com o entusiasmo desenvolvido por antigas belezas imaginárias, que a humanidade colhe hoje verdades, que talvez não tivessem nascido nem encontrado ambiente favorável se essas sacrificadas ilusões não tivessem primeiro habitado e aquecido o coração e a razão, onde as verdades vão descer. Felizes os olhos que não precisam de ilusão para ver a grandeza do espetáculo! Para os outros, é ilusão que os ensina a ver, a admirar e a comprazer-se. E por mais alto que olhem, nunca poderão ver muito alto. Desde que se aproximam, a verdade eleva-se; desde que admiram, aproxima-se. E por mais alto que suba o seu comprazimento, nunca se comprazerão no vácuo, nem acima da verdade desconhecida a eterna, que é, sobre todas as coisas, como beleza em suspensão.
A onde vão eles? - perguntaria a si próprio, depois de nos ter observado durante anos ou séculos; - que fazem? Qual é o centro e o alvo da sua vida? Obedecer a algum Deus? Não vejo nada que lhes guie os passos. Um dia, parecem edificar e amontoar pequenas coisas, e, no dia seguinte, destroem-nas. Vão e voltam, juntam-se e dispersam-se, mas não se sabe o que desejam. Oferecem uma infinidade de espectáculos inexplicáveis. Vê-se, por exemplo, que não fazem, por assim dizer, nenhum movimento. Muitas vezes, uns são mais volumosos que outros. Ocupam habitações, dez ou vinte vezes mais vastas, mais engenhosamente edificadas e mais ricas, que as habitações usuais.
Nós também obedecemos simplesmente às necessidades, à atração do prazer ou ao horror do sofrimento; e o que chamamos a nossa inteligência tem a mesma origem e a mesma missão do que chamamos instinto nos animais. Realizamos certos atos, cujos efeitos julgamos conhecer, e os sentimos, gadanho-nos de penetrar as causas , melhor que os animais; mas além de que essa suposição não tem base inabalável, aqueles atos são mínimos e raros, comparados com a quantidade enorme dos outros; e todos eles, os mais conhecidos e os mais ignorados, os menores e os mais grandiosos, os mais próximos e os mais afastados, realizam-se numa noite profunda, onde é provável que nos víssemos quase cegos como supomos que são elas.
Se bem o consideramos, procede daquele simples bom senso, que frequentemente faz muito mal e que respondia a Galileu: - “Não é a Terra que gira, porque vejo o Sol mover-se nos céus, subir de manhã e descer à tarde, e porque nada pode prevalecer ao testemunho dos meus olhos.” - O bom senso é excelente e necessário ao nosso espíritu, mas com a condição de que lhe assista uma desconfiança elevada, e lhe lembre, em caso de necessidade, a sua infinita ignorância: aliás, não é senão a rotina das partes inferiores da nossa inteligência. Não é espantoso que a nossa ciência seja tão curta como a nossa experiência? Não sabemos nós que, na evolução de uma espécie, um século passa despercebido, como uma gota de chuva no seio de um rio, e que, na vida da matéria universal, os milenários passam tão depressa como os anos na história de um povo?.
Mas se aceitamos, por um instante, a hipótese do transformismo, o espectáculo dilata-se e o seu clarão grandioso atinge logo os nossos próprios destinos. Não é evidente, mas o observador atento facilmente reconhecerá que existe na natureza uma vontade que tende a elevar uma porção da matéria a um estado mais sutil e talvez melhor, a penetrar-lhe pouco a pouco a superfície com um fluido cheio de mistério, que primeiro chamamos visa, depois instinto, e logo em seguida inteligência; a assegurar, a organizar, a facilitar a existência de tudo que se anima para um fim desconhecido. Não é certo, mas os exemplos que vemos em volta de nós convidam-nos a supor que, se pudéssemos avaliar a quantidade de matéria que desde a origem se criou assim, verificar-se-ia que ela não deixou de aumentar. Repito que a observação não é de grande monta, mas é a única que ainda se pode fazer à cerca da força oculta que nos conduz; e já é muito, enquanto não houver certeza contrária, neste mundo, em que o nosso primeiro dever é a confiança na vida, ainda que no mundo se não descobrisse nenhuma luz animadora.
Não é preciso aceitar cegamente as verdades proclamadas na época em que se vive. Mas quando se não pode saber a verdade de uma coisa, bom é que se aceite a hipótese de que, no momento em que o acaso nos faz nascer, se impõe mais imperiosamente a razão. Poderá ser falsa; mas, enquanto se julga verdadeira, pe útil, reanima encoraja e impulsiona a investigação numa nova direção. a primeira vista, para substituir suposições engenhosas, pareceria mais discreto dizer simplesmente a verdade profunda, que é a ignorância. esta verdade, porém seria salutar, como se se provasse que sempre se ignorará; e manter-nos-ia, entretanto numa imobilidade mais funesta que as irritantes ilusões.
Nós somos assim, nada nos leva mais longe nem mais alto, do que o impulso de nossos erros. Na essência, o pouco que temos aprendido devemo-lo a hipótese, sempre arriscadas, muitas vezes absurdas, e, pela maior parte, menos circunspectas que as de hoje. Transmitimos aquele ardor, não intacto, mas aumentado, e nada pode aumentá-lo mais que a hipótese do transformismo, que nos força a interrogar, com método severo a paixão constante, tudo que existe sobre a terra, nas suas entranhas, nas profundidades do mar e na vastidão dos céus. Que é o que se lhe opõe, e que temos nós para pôr no seu lugar, se a rejeitamos? Temos a grande confissão da ignorância sábia que se conhece, mas que, de ordinário, é inativa e desanima a curiosidade, mais necessária ao homem que a própria sabedoria; ou temos a hipótese da fixidez das espécies e da criação divina, que afasta para sempre as partes vivas do problema e se desembaraça do inexplicável, prohibido interrogá-lo.
Bom pode ser que tudo isto seja fantasia e que nossa espiral de clarões, não se ilumine senão para diversão das trevas. Pode ser também que um enorme incidente, vindo de fora, de outro mundo ou de um fenômeno, dê repentinamente sentido definitivo aquele esforço ou definitivamente o destrua. Sigamos, entretanto, o nosso caminho, como se nada de anormal devesse sobreviver. Suponhamos que amanhã uma revelação, por exemplo, uma comunicação com um planeta mais antigo e mais luminoso devesse transformar a nossa natureza, suprimir as paixões, as leis às verdades radicais do nosso ser, - mais prudente seria consagrar todo o dia de hoje a tomar interesse por essas paixões, por essas leis e por essas verdades, a harmonizá-las em nosso espírito, a mantermo-nos fiéis ao nosso destino, que se cifra em dominar e elevar, alguns graus ao menos, as forças obscuras da vida, em nós próprios e em volta de nós.
É possível que nada subsista naquela revelação, mas é impossível que aqueles que tenham cumprido até o final a missão que prega por excelência missão humana, se não encontrem na primeira fila para acolher aquela mesma revelação e dado até que ela lhes ensinasse que o verdadeiro e único dever seria a descuriosidade e a resignação com o incognoscível , eles saberiam melhor que os outros, compreender essa descuriosidade e resignação definitivas, e delas tirar proveito. Como todos procedem com forças iguais, ainda que tivessem começado por perjudicar-se o menos possível, isto é, a ajudar-se; terão pois a aparência de se entenderem, e de concorrerem para o mesmo alvo; e o observador certificar-se-á de que cada movimento terá o seu motivo; e daí surgirão maravilhas ou monstros de raciocínios sem número; pois aqueles dez mil indivíduos, que foram todos produzidos ao mesmo tempo, não podem deixar de fazer todos a mesma coisa, e, por pouco sentimento que tenham, de tomar os hábitos comuns, de se combinar, de se encontrar, de se ocupar da sua habitação, de lá voltar depois de se terem afastados, etc.; e daqui a arquitectura, a geometria, a ordem, a previdência, o amor pátrio, a república, numa palavra, tudo baseado, como se vê, na admiração do observador.
Eis uma forma, realmente avessa de explicar. Pode parecer mais natural à primeira vista; mas não o será de fato, pela razão muito simples de que não explica quase nada? Perjudicando-se o menos possível, de acordo com as necessidades da vida comum, não pressupõe acaso certa inteligência, que parecera tanto mais notável, quanto se examinar de mais perto a maneira com que aqueles “dez mil indivíduos” evitam prejudicar-se e chegam a ajudar-se? Portanto, não é falar verdade; e que diz o velho naturalista mal-humorado, que se não aplique exatamente a todas as nossas sociedades humanas? A nossa discrição, as nossas virtudes, a nossa política, ruins frutos da necessidade que a nossa imaginação dourou, não têm outro alvo senão servir ao nosso egoísmo e converter em bem comum a atividade, naturalmente prejudicial, de cada indivíduo. Além disso, não temos predicados para julgar, em nome da nossa inteligência, as deficiências e os erros. Pois não temos nós visto que a nossa consciência e a nossa inteligência vivem muito tempo em meio de erros, sem os perceber, e sem lhes dar remédio?